(b) O conceito de ente: o Aquinate concebe o ente analogamente. O conceito de ente não é unívoco, porque não se diz só e da mesma maneira de um único ser. O que é unívoco? O conceito unívoco diz-se do nome que significa uma mesma essência, que se diz de uma única natureza, ou seja, a conveniência do nome com a natureza, como no caso do nome Deus [S.Theo.I,q5,a6,ad3/q13,a10,c/In II Sent. 22,1,3,ad2]. O conceito de ente não é equívoco, porque não é o que significa várias coisas por um mesmo nome [C.G.4,49], como ocorre na ambigüidade, onde se toma a similitude entre as realidades, mas a unidade do nome [C.G.1,33] em que não há proporcionalidade entre o nome e a essência, ou seja, o nome é comum, mas as subtâncias diversas, como ocorre com o nome cão dito do animal, da constelação e do temperamento irascível do homem [S.Theo.I,q4,a2,c]. O conceito de ente não é genérico, porque não inclui todas as diferenças [In I Met. lec.9, n.139] predicáveis do ente que fazem parte da definição, como o conceito de animal que inclui as diferenças racional e irracional [S.Theo.I,q3,a5,c], como no conceito de ente não entra alto, magro, baixo, gordo etc. O conceito de ente é análogo, porque resulta da comparação entre os diversos entes, por proporção [S.Theo.I,13,a5,c], em que o nome, segundo um significado aceito, é posto na definição de algo, com outro significado [S.Theo.I,13,a10,c], como o que se diz de algo que comumente se aplica a muitos [In I Sent.22,1,3,ad2], como saudável dito do alimento e do corpo que dele se alimenta. O ente considerado em si mesmo, como algo que existe fora da mente, de modo autônomo e independente, é dito essencial, como o abacateiro. O ente considerado como algo que existe fora da mente, mas que existe em outro, como algo que depende da existência do outro, é dito acidental, como o tom de cor verde do abacateiro. O ente que existe fora da mente é dito real porque é uma realidade concreta e singular e o ente que é considerado pela e na mente é dito de razão, porque ou é uma imagem ou um conceito abstrato e universal. O ente que já é o que é, é dito ente em ato, como o abacateiro é abacateiro em ato. O ente que vem a ser o que ainda não é é dito ente em potência, como a semente de abacateiro que ainda não é abacateiro em ato, senão só em potência. Neste sentido, ente se diz da essência, do acidente, real e de razão, da potência e do ato [In V Met. lec.9, n.885]. Mas há que advertir que ente por acidente não é propriamente ser [In XI Met. lec.8, n.2272] e, por esta razão, não há ciência acerca do ente por acidente [In VI Met. lec.2, n.1172-1176].
O ente que é considerado abstraído da realidade concreta, pelo intelecto, é dito ente abstraído ou, como já dissemos, ente de razão [STh.I-II,q8,a1,ad3]. Há o ente de razão com fundamento no real, dito desta maneira porque resultou da abstração de uma realidade concreta, como o conceito de maçã. Há, também, o ente de razão raciocinado, enquanto produzido pela razão só a partir dos dados da imaginação, com as imagens que já existem nela, daí ente de razão derivado do raciocínio da razão, como produzido pela imaginação, por exemplo, uma maçã com asas, ou minotauro. Daí, ente de razão com fundamento no real e ente de razão raciocinado ou raciocinante. De qualquer modo, a consideração do ente de razão é póprio da Lógica [In IV Met. lec.4, n.574] e do ente real, considerado em si mesmo, é próprio da Metafísica. Em um e outro caso, o estudo do ente é primeiríssimo, porque é o que primeiro capta o intelecto quando considera o real [In I Met. lec.2, n.46]. Concluindo, quando o intelecto concebe o ente afirma que o ente é aquilo que é e o não-ente aquilo que não é, sendo impossível conceber o ente sendo e não sendo ao mesmo tempo. Desta captação do ente real, o intelecto, a partir dos primeiros princípios de conhecimento que possui como hábitos, formula os primeiros princípios de demonstração.
Nenhum comentário:
Postar um comentário